mardi 1 octobre 2019

A arte da "canção costura"



Existem alguns compositores raros, especialmente talentosos na "canção costura". Ou a «canção puzzle», uma técnica que permite reunir pequenas partes de canções demasiado curtas para serem exploradas como uma entidade. Rascunhos inacabados, deixados numa gaveta, e que um dia retomam, para os juntar a outras partes escritas ulteriormente, e que com uma «ponte», conseguem fazer de três esboços, uma única peça concluída.


Mercury, 6 trechos para uma "rapsody" 

 Freddy Mercury (Queen), foi muito forte neste pequeno jogo, e basta citar «Bohemian Rhapsody» para ilustrar esta técnica de montagem que pode, em alguns casos, ser brilhante. Os musicólogos distinguem 6 partes na «Rapsódia» em questão.

Mercury já tinha dado provas com o «Liar» do primeiro álbum (1973), antes de atingir uma certa perfeição com «The March of the Black Queen», uma proeza do álbum «Queen II» (1974). O mesmo disco tem uma outra composição «fragmentada» com «The Fairy Feller’s Masterstroke/Nevermore», outra pequena obra-prima do género.




 The Beatles em estudio, 1968 

O exercício pode revelar-se perigoso (ou seja, pouco convincente), quando a obra combinada é feito dos esboços de compositores diferentes. No seu terceiro álbum de Queen, «Sheer heart attack» (1974), uma sucessão de três partes: uma escrita por Roger Taylor («Tenement funster»), seguida de duas de Mercury («Flick of the Wrist» e «Lily of the valley»), se encadeam bem, mas a sua sucessão não era indispensável. Haverá ainda «Millionaire waltz» sobre «A Day at the race» (1976), e talvez outras obras cujas cenas nos são desconhecidas.

Este assunto veio-me à ideia, quando sai nestes dias a versão aumentada de «Abbey road» (1969), da qual Gilles Martins (o filho do génio Georges) recebeu (como para «Sgt Peppers» e o duplo «White album»), a responsabilidade de lançar uma versão de aniversário que não seja indigesto. O talento do filho parece seguir o do pai e estas missões foram bem sucedidas até agora. Ela vai terminar com o álbum. «Let it be» (1970), que eu teria trocado com uma versão aumentada de «Revólver» (1966), que não está prevista.

«Abbey Road», o verdadeiro último álbum dos Beatles é conhecido por conter na sua face B, as «patchworks» mais fantásticas do rock que são «You never give me your money» de Paul Mc Cartney, construído em 3 partes; a sequela «Sun King»/ «Mean Mr Musterd»/ «Polythene Pam»/ «She came in through the bathroom window» co-escrita por Paul e John; e por fim «Golden Slumbers»/ «Carry that weight»/ «The end”, que ostenta a marca de Mc Cartney. Estes três conjuntos virtuosos fazem talvez «Abbey Road», o melhor álbum dos quatro músicos, que só a presença de «Octopus’s garden» e «Maxwell’s Silver Hammer» na face A enfraquece o nível do repertório. Substitua estes dois últimos por «Old brown shoe», a obra-prima subestimada de George Harrison, e «The Ballad of John and Yoko», duas canções incluídas nesta versão revisitada, lançadas em single na mesma época, E tínhamos um álbum perfeito.



Em seguida, Paul Mc Cartney irá demonstrar o seu interesse nestes pequenos jogos de composições sobre vários temas. Sobre «Ram» (1971), cria desta forma «Uncle Albert/Amiral Halsey», antes de dar um dos exemplos mais evidentes com «Band on the Run» (1973). Nestes exemplos, ele usa o método de modo a trazer uma auge que o ouvinte sabe que terá direito em algum momento da canção. E até ao último álbum «Egypt station» (2018), não pode deixar de se dedicar a este jogo como no «Despite repeating warning», que encadeia claramente 4 temas por 7 minutos, um dos quais não deixa de recordar «Live and let die» (1973), ainda uma canção (trilha sonora do primeiro James
Bond com Roger Moore), feita de várias partes, cujo instrumento apocalíptico continua a ser o apogeu da canção. Da mesma época Paulo compõe «Venus and Mars/ Rock show» que o músico aumenta de «Jet», em versão ao vivo. Com as suas linhas vocais entrelaçadas, Paulo poderia ter-nos repetido o golpe com «Silly Love song» (1976), mas ter-nos-ia privado de um delicioso exercício de coro cruzado.

Outros títulos de Paulo foram compostos em várias partes, mas isso foi o resultado de títulos incompletos, e posteriormente reformulados.

 Em conclusão, esta técnica permite-me prestar homenagem ao trabalho de Gilles Martins, que nas suas remixagens, aumentadas por algumas versões interessantes ou inéditas, fez um trabalho honroso, sem cair na armadilha de o fazer, ou de dar demasiado!

PS: Esta nova versão revisitada de «Abbey Road» sai nestes dias em caixa vinílica, Cds, e para se divertir, remasterizado em picture disc. Para quem não tivesse o álbum essencial já nas prateleiras.




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